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TRT anula acordo que restringia contratação de pessoas com deficiência

06-12-2006 - Fonte: Espaço da Cidadania

TRT anula acordo que restringia contratação de pessoas com deficiência

O Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (TRT-SP) anulou a cláusula da convenção coletiva mediada pela Delegacia Regional do Trabalho de São Paulo (DRT-SP) que discriminava a contratação de pessoas com deficiência (PCD) por empresas de transportes de cargas de São Paulo. A decisão ocorreu em 16 de novembro.

A anulação foi pedida pelo Ministério Público do Trabalho (MPT), em outubro de 2005, porque a cláusula restringia a presença de PCD somente à área administrativa. Enquanto a lei 8213/91, conhecida como Lei de Cotas, determina percentuais de contratação que variam de 2% a 5% do total de trabalhadores e em diferentes áreas da empresa. O TRT-SP já havia concedido liminar em 25 de outubro de 2005.

A convenção coletiva foi assinada em setembro de 2005 por cinco sindicatos de trabalhadores e o Sindicato das Empresas de Transporte de Cargas de São Paulo e Região (Setcesp), com o assessoramento e mediação da DRT. Mas o Sindicato dos Trabalhadores do Ramo de Cargas de Osasco e Região (Simtratecor) se recusou a assinar o documento e denunciou o acordo que tentava sabotar a Lei de Cotas.

Durante os 13 meses que separaram a entrada do pedido do MPT e a decisão do TRT, ocorreram várias manifestações no processo por parte de sindicatos de trabalhadores e das empresas, nas quais tentavam justificar o injustificável. A própria DRT, que elogiava o acordo em seu site, chegou a utilizar o seu Informativo nº 6, de dezembro de 2005, para criticar aqueles que se mostravam perplexos com a atitude, dizendo que eram “iniciativas travestidas de falso zelo pelo cumprimento da legislação, permeadas de falta de bom-senso”.

Na fundamentação de sua decisão, o juiz relator do processo, Carlos Francisco Berardo, assinalou que “na realidade, a manutenção [da cláusula] resulta em sérios prejuízos aos direitos sociais, coletivos, individuais, indisponíveis e irrenunciáveis dos portadores de deficiência, bem como à ordem jurídica democrática, como estabelece o autor [o MPT]”.

Informações com

Carlos Aparício Clemente

Coordenador do Espaço da Cidadania

e diretor do Sindicato dos Metalúrgicos de Osasco e Região

11-3685-0915

Consulte também:

www.prt2.mpt.gov.br e www.trt2.gov.br

PROCESSO TRT/SP SDC nº 20297200500002001

AÇÃO ANULATÓRIA

Requerente: Ministério Público do Trabalho

Requerido :

1. setcesp - SINDICATO DAS EMPRESAS DE TRANSPORTE DE CARGAS DE SÃO PAULO E REGIÃO;

2. SINETROSV - SINDICATO DOS EMPREGADOS EM ESCRITÓRIO DE EMPRESAS DE TRANSPORTES RODOVIÁRIOS NO SETOR ADMINISTRATIVO DE CARGAS SECAS E MOLHADAS, RODOVIÁRIOS URBANOS DE PASSAGEIROS, INTERMUNICIPAL, INTERESTADUAL, SUBURBANO E FRETAMENTO DE OSASCO, SOROCABA, VALE DOS RIBEIRA E RESPECTIVAS REGIÕES;

3. SINDICATO DOS EMPREGADOS EM ESCRITÓRIOS DE EMPRESAS DE TRANSPORTES RODOVIÁRIOS DE CARGAS SECAS E MOLHADAS, RODOVIÁRIO URBANO DE PASSAGEIRO, RODOVIÁRIO INTERMUNICIPAL, RODOVIÁRIO INTERESTADUAL, RODOVIÁRIO DE TURISMO E FRETAMENTO DE GUARULHOS E REGIÃO-SP;

4. SINDICATO DOS EMPREGADOS EM EMPRESAS DE TRANSPORTES RODOVIÁRIOS, CARGAS SECAS E MOLHADAS, E ANEXOS DE GUARULHOS E REGIÃO;

5. SINDICATO DOS TRABALHADORES EM TRANSPORTES RODOVIÁRIOS DE JUNDIAÍ E REGIÃO;

6. SINDILOG - SINDICATO DOS EMPREGADOS EM ESCRITÓRIOS DE TRANSPORTES RODOVIÁRIOS DE CARGAS SECAS E MOLHADAS, CARGAS PESADAS E LOGÍSTICAS EM TRANSPORTES DE SÃO PAULO E ITAPECERICA DA SERRA.

AÇÃO ANULATÓRIA. ART. 93 DA LEI 8213/91. ART. 611 DA CLT. CLÁUSULA DE CONVENÇÃO COLETIVA DE TRABALHO, EM CONFRONTO COM O QUE ESTABELECE A LEI. Cláusula de convenção coletiva que dispõe sobre a proporcionalidade de funções - destinada a empregados com deficiência ou reabilitados pela Autarquia -, a ser considerada em relação às existentes nas empresas, em confronto com o que estabelece a Lei. Transporte de carga. Limitação da base de incidência da proporcionalidade às funções administrativas e não à totalidade das referidas funções. Matéria de ordem pública que não diz respeito às condições de trabalho que serão aplicadas aos contratos individuais de trabalho, às quais limita o legislador consolidado o objeto de norma coletiva. Ação que é julgada procedente.

I - Relatório

Trata-se de Ação Anulatória com pedido de liminar, apresentada pelo D. Ministério Público do Trabalho, objetivando a imediata suspensão dos efeitos da cláusula primeira, caput, e § 1º, das cinco Convenções Coletivas de Trabalho firmadas pelos ora requeridos em 20.09.05.

Assegura o requerente que a reserva legal de vagas a pessoas com deficiência e beneficiários reabilitados, nos termos da Lei 8.213/91 e do Decreto 3.298/99, não pode ser disciplinada através de instrumento normativo; que a cláusula primeira em questão não observa os parâmetros fixados pelo legislador, notadamente quanto ao percentual de vagas a serem disponibilizadas, resultando em "sérios prejuízos aos direitos sociais, coletivos, individuais indisponíveis e irrenunciáveis dos portadores de deficiência, bem como à ordem jurídica democrática" (fl. 05 sétimo parágrafo), e em ofensa à ordem jurídica constitucional e infra-constitucional.

Aduz, outrossim, que a manutenção da cláusula em questão poderá servir como incentivo para que outras categorias firmem instrumentos semelhantes, aplicando a legislação em vigor da forma que melhor lhes convier, residindo nesse fato o periculum in mora ensejador da concessão de medida liminar.Afirma ainda que o art. 93, da Lei 8213/91; o Decreto 3298/99; o art. 611, da CLT e a Convenção 111 da OIT estão afrontados pela cláusula referida; que o art. 93 dispõe que a empresa com 100 (cem) ou mais empregados está obrigada a preencher de 2% (dois por cento) a 5% (cinco por cento) dos seus cargos com beneficiários reabilitados ou pessoas portadora de deficiências habilitadas; que o objetivo da lei não é a contratação da pessoa com deficiência em determinado cargo ou função, mas sim que o percentual previsto no referido artigo incida sobre o número total de empregados da empresa, cabendo ao empregador, diante de seu poder diretivo, determinar quais os cargos que serão preenchidos por esses empregados.

Assere que o poder normativo dos sindicatos é amplo, mas não é ilimitado, nos termos do art. 611/CLT e que o direito positivado é indisponível, vedada qualquer transação a seu respeito, mencionando o art. 1º, inciso I, alínea "b" da Convenção nº 111 da OIT.

Pelo despacho de fls. 39/42 foi deferida antecipação da tutela de emergência.

Através da defesa trazida às fls. 51/56, o Sindicato dos Empregados em Empresas de Transportes Rodoviários e Anexos, Super Pesados, Líquidos, Entregadores de Mercadorias, Diferenciados, Depósitos, Locadoras de Veículos e Cargas Secas e Molhadas em Geral de Guarulhos e Região – SINDICARGAS, e o Sindicato dos Empregados em Escritórios de Empresas de Transportes Rodoviários de Cargas Secas e Molhadas, Rodoviário Urbano de Passageiros, Rodoviário Intermunicipal, Rodoviário de Turismo e Fretamento de Guarulhos, Arujá, Santa Isabel, Mairiporã, Atibaia, Bragança Paulista, Bom Jesus dos Perdões, Piracaia, São José dos Campos e toda Jurisdição do Vale do Paraíba - SINDIESCRIT às fls. 60/65, alegam que não houve atentado à Constituição Federal ou às leis pertinentes à investidura de pessoas com deficiência física e que o objetivo através de um percentual único foi ampliar o mercado de trabalho, haja vista que 90% (noventa por cento) das empresas abrangidas pelos Sindicatos, têm número de funcionários inferior ao mínimo estabelecido para a faixa de 501 (quinhentos e um) a 1000 (mil) empregados, em decorrência da ausência de aptidão do trabalhador, se observada a tabela da Lei 8213/91, em face da natureza das funções a serem preenchidas. Afirmam que dentro do que especifica a legislação, na forma que transcrevem, às pessoas portadoras de deficiência são conferidas as prerrogativas do art. 37, inciso VIII, da Constituição Federal, e da legislação que indica, assegurando-se-lhes o direito da inscrição para o cargo em concurso, em atribuições que sejam compatíveis com a deficiência de que são portadoras; que a convenção coletiva preservou o direito dos portadores de deficiência; que a especificação da contratação para cargos administrativos, não torna nula a contratação em serviços operacionais; que na forma da cláusula que transcreve, não trata a mesma de limitação de funções ou especificação de vagas na área operacional, mas o que busca é deixar de seguir uma tabela menos humanista nos termos da Lei 8213/91; que o percentual único (quatro por cento) sem que haja limites pré-estabelecidos de empregados nas empresas, torna o acesso aos empregos pelos portadores de deficiência física com considerada elevação nos quadros de trabalho, trazendo gráfico para ser observado; que a convenção coletiva foi firmada em face às considerações do Ministério Público do Trabalho, demonstrando o interesse ao trabalho dos portadores de deficiência física, e considerando que o empenho é mútuo para melhor aproveitamento da classe.

O Sindicato das Empresas de Transporte de Cargas de São Paulo e Região – SETCESP respondeu (fls. 66/82) aduzindo que em uma empresa de "TRC" – Transporte Rodoviário de Cargas as atividades especializadas demandam corpo funcional com plena capacidade física (motoristas, ajudantes de carga e descarga e arrumadores de cargas); que a aplicação das normas legais assecuratórias do percentual de cotas para deficientes está circunscrita àqueles, trabalhadores alocados no quadro de conferentes de cargas e na área administrativa; que é impossível admitir-se um cego ou um deficiente físico para dirigir um caminhão ou carregar volumes, ainda que de peso médio.

Afirma que as entidades sindicais não tiveram a mínima intenção de criar suposta discriminação na contratação dos portadores de deficiências físicas, mas, sim, pretenderam possibilitar condições reais e concretas de acessibilidade dos portadores de deficiência no mercado de trabalho.

Aduz que a cota de 4% (quatro por cento) que foi estabelecida supera o índice legal de 2% (dois por cento) em empresas dentre 100 (cem) e 200 (duzentos) empregados e 3% (três por cento) de 200 (duzentos) a 500 (quinhentos) empregados.

Estabelece que buscou assessoramento da DRT/SP-MTE. E da mediação resultou a convenção coletiva em causa, trazendo jurisprudência em abono.

Afirma, ainda que a norma coletiva tem de ser interpretada sistematicamente, em seu conjunto, pela teoria do conglobamento, aplicando-se o art. 422 do Código Civil e o art. 7º, inciso XXVI, da Constituição Federal.

O Sindicato dos Trabalhadores em Transportes Rodoviários de Jundiaí e Região (fl. 117) ratificou os termos da contestação de fls. 60/82.

A contestação do Sindicato dos Empregados em Escritório de Empresas de Transportes Rodoviário de Osasco, Sorocaba, Vale do Ribeira e Região - SINETROSV encontra-se às fls. 120/133. Alega que o transporte rodoviário de cargas não guarda relação de identidade com nenhum outro setor da atividade empresarial por ser especialíssimo; que o percentual estabelecido é mais benéfico que aquele mencionado na Lei, ocorrendo a intervenção da DRT e é forçoso admitir a teoria do conglobamento, bem como os princípios da boa-fé e da igualdade.

Foram trazidos numerosos documentos. Houve conversão em diligência (fls. 208/209) e, finalmente, a instrução foi encerrada.

Apresentaram ainda, memoriais, o Sindicato dos Empregados em Escritório de Empresas de Transportes Rodoviário de Osasco, Sorocaba, Vale do Ribeira e Região - SINETROSV (fls. 196/206); o Autor, Ministério Público do Trabalho (fls. 238/241) e o Sindicato das Empresas de Transporte de Cargas de São Paulo e Região – SETCESP (fl.244).

É o relatório.

II – Fundamentação

A cláusula questionada, incluída nas convenções coletivas mencionadas pelo Ministério Público do Trabalho, na petição inicial, traz a redação seguinte:

"As empresas de transporte rodoviário de cargas e logística, com matriz localizada na base territorial do SETCESP e do sindicato de empregados acima e que mantêm a seus serviços 100 ou mais empregados e que aderirem ao presente acordo, ficam obrigadas a contratar pessoas com deficiência na proporção de 4% (quatro por cento) do seu quadro de empregados administrativo.

Parágrafo primeiro Entende-se por empregados administrativos todos aqueles eu não exerçam atividade de cunho operacional, como motorista, ajudante, arrumador de carga e correlatos, que exijam esforço físico ou outra habilidade incompatível às pessoas com deficiência, conforme o Decreto nº 5.296/04."".

É incontroverso que a proporcionalidade adotada pelas entidades convenentes estão em desconformidade com o art. 93 da Lei 8213/91, que estabeleceu que as empresas com mais de 100 (cem) empregados estão obrigadas a disponibilizar de 2% (dois por cento) a 5% (cinco por cento) de suas funções (totalidade, não apenas funções do quadro administrativo) na proporção indicada.

Da mesma forma, há conflito com o disposto no art. 36, do Decreto 3298/99 e no art. 611, da CLT.

Tanto a validade, como a eficácia dessa cláusula, são nenhuma porque os dispositivos legais e de regulamento referidos constituem normas de ordem pública, de natureza cogente, imperativa e de caráter indisponível.

Tais regras dizem respeito essencialmente ao interesse público, de inegável proteção aos trabalhadores portadores de deficiência.

O objetivo essencial da norma coletiva (convenção ou acordo) é o de estabelecer condições de trabalho que serão aplicadas aos contratos individuais dos trabalhadores. Significa que a natureza jurídica normativa de tais ajustes diz respeito à criação de direitos e obrigações aplicáveis aos contratos individuais dos trabalhadores, representados pelos sindicatos das categorias profissionais respectivas.

E, na hipótese, as entidades convenentes voltaram-se para estabelecer regra sobre matéria legislativa que é reservada ao Poder Público.

A nota técnica e o termo de compromisso de ajustamento de conduta, referidos pelos réus trazem teor que em nada influem nesta decisão.

A observância do percentual referido tampouco menciona que as empresas de transporte de carga deverão admitir um deficiente visual ou um deficiente físico para dirigir um caminhão ou carregar volumes, ainda que de peso médio. Nada faz concluir nesse sentido. Indica, apenas, que há de ser considerada a totalidade das funções para incidência do percentual. Cabe ao empregador, pois, determinar quais os cargos que podem ou devem ser preenchidos pelos empregados portadores de deficiência, observadas as peculiaridades e limitações próprias para cada função.

Na realidade, a manutenção resulta em sérios prejuízos aos direitos sociais, coletivos, individuais indisponíveis e irrenunciáveis dos portadores de deficiência, bem como à ordem jurídica democrática, como estabelece o Autor.

Por todo o exposto, examinado o mais que dos autos consta, julgo procedente a ação anulatória. Por conseguinte, declaro a nulidade da cláusula primeira, caput e seu § 1º das cinco convenções coletivas formadas entre, de um lado, o primeiro réu e, de outro, os demais demandados, na forma requerida à inicial.

Arcarão os réus com as custas calculadas sobre R$ 12.000,00, no importe de R$ 240,00 proporcionalmente, cabendo a cada qual o valor de R$ 40,00.

CARLOS FRANCISCO BERARDO

Juiz Relator

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